terça-feira, 20 de outubro de 2009

VINICIUS DE MORAES







Soneto do Orfeu


São demais os perigos dessa vida

Para quem tem paixão, principalmente

Quando uma lua surge de repente

E se deixa no céu, como esquecida

E se ao luar, que atua desvairado

Vem unir-se uma música qualquer

Aí então é preciso ter cuidado

Porque deve andar perto uma mulher

Uma mulher que é feita de música

Luar e sentimento, e que a vida

Não quer, de tão perfeita

Uma mulher que é como a própria lua:

Tão linda que só espalha sofrimento,

Tão cheia de pudor que vive nua.

*


Tomara Que você volte depressa

Que você não se despeça

Nunca mais do meu carinho

E chore, se arrependa

E pense muito

Que é melhor se sofrer junto

Que viver feliz sozinhoTomara

Que a tristeza te convença

Que a saudade não compensa

E que a ausência não dá paz

E o verdadeiro amor de quem se ama

Tece a mesma antiga trama

Que não se desfaz

E a coisa mais divina

Que há no mundo

É viver cada segundo

Como nunca mais...





O VELHO E A FLOR Por céus e mares eu andei,

Vi um poeta e vi um rei

Na esperança de saber

O que é o amor.

Ninguém sabia me dizer,

Eu já queria até morrer

Quando um velhinho

Com uma flor assim falou:

O amor é o carinho,

É o espinho que não se vê em cada flor.

É a vida quando

Chega sangrando aberta em pétalas de amor.



De tudo ao meu amor serei atento

Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto

Que mesmo em face do maior encanto

Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento

E em seu louvor hei de espalhar meu canto

E rir meu riso e derramar meu pranto

Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure

Quem sabe a morte, angústia de quem vive

Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):

Que não seja imortal, posto que é chama

Mas que seja infinito enquanto dure.


Eu não existo sem você
















Eu sei e você sabe, já que a vida quis assim
Que nada nesse mundo levará você de mim
Eu sei e você sabe que a distância não existe
Que todo grande amor
Só é bem grande se for triste
Por isso, meu amor
Não tenha medo de sofrer
Que todos os caminhos
Me encaminham pra você
Assim como o oceano
Só é belo com luar
Assim como a canção
Só tem razão se se cantar
Assim como uma nuvemSó acontece se chover
Assim como o poeta
Só é grande se sofrer
Assim como viver
Sem ter amor não é viver
Não há você sem mim
Eu não existo sem você.
Vinícius de Moraes

*


Enfim, depois de tanto erro passado
Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.
*
É bom sentá-lo novamente ao lado
Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.
*
Um bicho igual a mim, simples e humano
Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano.
*
O amigo: um ser que a vida não explica
Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...*
(Vinícius de Moraes)

www.pensador.info/autor/Vinicius_de_Moraes/
*

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